Possível processo da Aneel para avaliar a caducidade da concessão reacende debate sobre mecanismos mais rápidos de resolução de disputas em serviços essenciais
O apagão que deixou mais de 2,2 milhões de imóveis sem energia elétrica na região metropolitana de São Paulo, em 9 de dezembro de 2025, voltou a expor falhas no modelo de gestão das concessões públicas. Diante disso, a possível abertura de processo administrativo pela Aneel contra a Enel intensificou o debate sobre a necessidade de mecanismos mais ágeis para resolver conflitos em serviços essenciais.
Apagão da Enel reacende debate sobre concessões
O problema no fornecimento de energia ocorreu após fortes ventos atingirem municípios da Grande São Paulo. Como resultado, milhões de consumidores ficaram sem luz, além disso, a concessionária já enfrenta histórico de falhas recorrentes.
Por esse motivo, o Ministério de Minas e Energia, o governo do Estado de São Paulo e a Prefeitura da capital passaram a defender a avaliação da caducidade do contrato de concessão da Enel. Atualmente, o contrato segue válido até 2028.
Ausência de prazo legal amplia insegurança
Segundo o advogado Rodrigo Carvalho Polli, mestre em Direito Administrativo e sócio do Martinelli Advogados, a situação se agrava pela ausência de prazo legal para a conclusão do processo administrativo. Na prática, a Aneel pode levar anos para decidir, enquanto isso, o contrato continua em vigor.
Em alguns cenários, o processo pode até ultrapassar o fim da concessão.
“Trata-se de um procedimento extremamente complexo. Além disso, a falta de prazo legal expõe a fragilidade do modelo de disputa hoje disponível no país”, afirma Polli.
Serviços essenciais exigem respostas mais rápidas
De acordo com o advogado, conflitos envolvendo serviços essenciais, como o fornecimento de energia elétrica, exigem respostas mais céleres, caso contrário, os impactos recaem diretamente sobre a população.
Por isso, Polli defende o uso de mecanismos preventivos, capazes de resolver divergências ainda durante a execução do contrato, nesse contexto, ganham espaço os dispute boards.

Como funcionam os dispute boards
Os dispute boards atuam como comitês técnicos independentes, formados por especialistas, desde o início do contrato, esses comitês acompanham a execução. Assim, conseguem identificar riscos com antecedência e evitam que divergências técnicas se transformem em litígios longos.
O modelo surgiu nos Estados Unidos, na década de 1960, posteriormente, organismos internacionais, como o Banco Mundial e o BID, passaram a adotar o mecanismo em projetos de infraestrutura.
Projeto de lei busca ampliar o uso no setor público
Atualmente, o Congresso analisa o PL 2.421/21, que teve origem no PLS 206/18. A proposta busca regulamentar o uso dos dispute boards em contratos administrativos continuados da União, Estados, Distrito Federal e municípios. Segundo Polli, os órgãos de controle passaram a enxergar o modelo com mais confiança.
Isso ocorreu após a consolidação de experiências bem-sucedidas.
“Hoje, os próprios órgãos de controle indicam os comitês como ferramentas úteis para esclarecer dúvidas técnicas e evitar paralisações”, explica.
Experiências brasileiras com dispute boards
No Brasil, a primeira aplicação prática ocorreu em 2003, durante a execução da Linha 4-Amarela do metrô de São Paulo. A partir desse marco, diversos contratos passaram a adotar o modelo.
Entre os principais exemplos, estão:
- PPP do Complexo Criminal de Ribeirão das Neves (MG);
- Obras dos estádios da Copa do Mundo de 2014;
- PPP da Rodovia MG-050;
- PPP da Arena das Dunas, em Natal.
Mais recentemente, o município do Rio de Janeiro avançou ao aprovar a Lei Complementar 285/25, que regulamentou o uso dos dispute boards na gestão de contratos públicos.




